Compreender para combater: cinco anos do golpe de 2016
Atualizado: 9 de mai. de 2022
No último 31 de agosto, completaram-se cinco anos do golpe que, antes de ser contra Dilma Rousseff e contra o Partido dos Trabalhadores (PT), foi sobretudo contra o Brasil e contra os pequenos avanços que tivemos sob as administrações petistas. Motivado por um escrito excelente de Marc Bloch, no qual o autor diz que a História se torna a ciência do presente e a ciência do passado e que, portanto, fornecer explicações plausíveis e inteligíveis é uma das formas que nós, historiadoras e historiadores, encontramos para atuar na sociedade, busco aqui indicar dez textos para auxiliar na compreensão do processo golpista ocorrido em 2016. Como cada escolha exige uma renúncia, corro o risco de deixar excelentes e necessárias análises de fora desta breve lista – não por serem menos importantes, é preciso deixar claro. Neste sentido, peço às leitoras e aos leitores que contribuam, em forma de comentário, com indicações de outras análises, pois o conhecimento transforma e faz com que tenhamos ferramentas necessárias para combater algo com o que não estamos de acordo. Sem mais enrolações, vamos aos textos.
1.
A radiografia do golpe: entenda como e por que você foi enganado (2016), de Jessé Souza.
Publicado pela editora LeYa, o livro de Jessé Souza traz argumentos importantes que, mais tarde, serão retomados em outras análises. Souza destaca o papel atuante da mídia no processo golpista, bem como a importância das manifestações de junho de 2013 para uma melhor compreensão do golpe ocorrido em 2016.
2. A apropriação conservadora do ciclo de protestos de 2013: rumo às manifestações anti-Dilma? (2018), de Marcelo Kunrath Silva.
Seguindo a análise de que é importante enterdermos as manifestações de 2013 para compreendermos o processo golpista, a próxima indicação é o artigo de Marcelo Kunrath Silva, publicado em 2018 na revista Lusotopie. O argumento central do texto é que a crítica ao PT e aos seus governos, resultou, muitas vezes, no antipetismo. Esse fenômeno, presente nos protestos de junho de 2013, possibilitou, parcial e temporariamente, uma convergência política entre os movimentos sociais e os contramovimentos conservadores, tendo estes últimos assumido a direção das manifestações ocorridas entre 2014 e 2016.
3. Divisão e reunificação do capital financeiro: do impeachment ao governo Temer (2019), de André Flores Penha Valle.
A dissertação de Mestrado em Ciência Política de André Valle, defendida na Unicamp, traz elementos importantes para refletirmos sobre alguns dos atores políticos do golpe. Nela, o autor analisa a atuação do capital financeiro – burguesia interna bancária, burguesia financeira associada e capital internacional – frente aos acontecimentos políticos de 2015 e 2016. Ao analisar as frações de classe, Valle demonstra como cada uma delas se posicionou, bem como quando se deu a unificação dessas classes em torno do impeachment, que acabou por promover uma restauração neoliberal visualizada no governo interino de Michel Temer (MDB).
4.
O colapso da democracia no Brasil: da Constituição ao golpe de 2016 (2019), de Luis Felipe Miguel.
Desde que o golpe ocorreu, o cientista político Luís Felipe Miguel vem escrevendo sobre o processo – portanto, nada mais justo que indicar seu livro, publicado pela editora Expressão Popular. Na obra, Miguel discute os limites da democracia brasileira, critica a atual forma de se fazer política e propõe reflexões sobre possíveis novos caminhos a serem seguidos. O livro pode ser baixado gratuitamente no site da editora.
5.
Enciclopédia do golpe, volume 1 (2017) e Enciclopédia do golpe, volume 2: o papel da mídia (2018), organizados por Barbara Caramuru Teles e Mirian Gonçalves, respectivamente.
Ambos os livros, publicados pelo projeto editorial Praxis, buscam refletir sobre conceitos que são fundamentais para compreendermos o golpe a partir de discussões propostas por especialistas. O primeiro volume reúne 22 verbetes que tratam dos sujeitos atuantes no golpe; o segundo volume, 28 verbetes referentes ao papel da mídia no processo golpista. Assim como o livro indicado anteriormente, ambas as enciclopédias podem ser baixadas gratuitamente na biblioteca virtual do CLACSO (Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais).
6.
O golpe de 2016 e a corrosão da democracia no Brasil (2020), organizado por Gilberto Cézar de Noronha, Idalice Ribeiro Silva Lima e Mara Regina do Nascimento.
Publicado pela Paco Editorial, o livro reúne diversas análises de cientistas de diferentes áreas do conhecimento. A novidade aqui se dá sobretudo pela distância temporal existente entre o processo e a escrita dos textos. Portanto, os artigos presentes nesta coletânea tratam, para além do processo golpista em si, das consequências imediatas do golpe.
7.
É presidenta, não presidente: a misoginia como elemento edificante do processo de impeachment contra Dilma Rousseff (2018), de Larissa Rosa.
Publicado pela editora Letramento, o livro de Larissa Rosa trata de um elemento muito presente na sociedade brasileira, acentuado pela eleição da primeira presidenta na história do país e pelo golpe de 2016: a misoginia. Rosa sustenta que o processo golpista teve um viés misógino que deve ser considerado quando se analisa o processo.
8.
À sombra do poder: bastidores da crise que derrubou Dilma Rousseff (2016), de Rodrigo de Almeida.
Escrito pelo então secretário de imprensa de Dilma, em forma de diário e publicado pela editora LeYa, o livro traz relatos – ou bastidores – que ajudam a elucidar os conflitos políticos ocorridos entre 2014 e 2016. Por estar imerso no dia a dia do governo, Almeida faz com que conheçamos os sujeitos que vivenciaram a crise política pela qual o governo petista passava.
9. Derechas y neogolpismo en América Latina: Una lectura comparada de Honduras (2009), Paraguay (2012) y Brasil (2016) (2019), de Lorena Soler e Florencia Prego.
O artigo de Lorena Soler e Florencia Prego, publicado na revista Contemporánea, busca fazer uma análise comparativa sobre os golpes ocorridos em Honduras, Paraguai e Brasil. As autoras apontam a existência de elementos em comum nesses golpes, perceptíveis quando cotejados, e sustentam que, atualmente, existem novas formas de se consumar golpes de Estado.
10.
Historiadores pela democracia: o golpe de 2016 e a força do passado (2016), organizado por Hebe Mattos, Tânia Bessone e Beatriz Mamigonian.
Por fim, não poderia deixar de mencionar a coletânea publicada pela Alameda Casa Editorial. O livro reúne diversos textos de historiadoras e historiadores que não deixaram de se posicionar em um momento em que muitas pessoas optaram por chamar o ocorrido de impeachment. Isto não é mera questão conceitual: é também uma opção ideológica. A destituição de Dilma Rousseff, a despeito da narrativa dos golpistas que buscam normalizar o processo, foi um golpe – e assim deve ser nomeada.
Créditos da imagem de capa: Reprodução.
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