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Foto do escritorHistória da Ditadura

Não é hora de ter medo!

Atualizado: 29 de abr. de 2021

 

Que o autoritarismo faz parte da cultura política brasileira, intelectuais importantes já vêm apontado há algum tempo (Leia Rodrigo Patto). Também não é novidade que parte considerável da sociedade brasileira acredita que as soluções arbitrárias são as mais adequadas para a resolução de todos os problemas brasileiros (Leia Carlos Fico).


Nunca é demais lembrar que, em pouco mais de 500 anos de história, o Brasil explorou legalmente a mão de obra escrava negra por quase 400 anos. Essa prática de horror deixou marcas profundas em nossa sociedade. Algumas já conseguimos identificar. Ainda levaremos muito tempo (se é que algum dia conseguiremos) para superar as máculas desse passado.

Dos pouco mais de 100 anos de regime supostamente republicano (Leia José Murilo de Carvalho), os primeiros 40 anos foram comandados por oligarquias que nunca tiveram projeto para o país, além de manter seu próprio poder político e econômico. Em seguida, viveríamos nossa primeira ditadura, que, embora só tenha começado oficialmente em 1937, já vinha se desenhando desde os momentos posteriores à chamada (erradamente) revolução de 1930. Entre 1945 e o golpe civil-militar de 1964, vivemos um ensaio de democracia que seria brutalmente interrompido com a inauguração de uma ditadura militar que durou 21 anos (isso em uma periodização bem conservadora, porém a mais aceita até agora). (Leia Jorge Ferreira).

Os últimos 30 anos da história recente do Brasil, foram marcados por uma democracia cheia de tropeços. Os militares nunca saíram totalmente de cena. Nenhum presidente civil conseguiu colocá-los em seu devido lugar. Em grande medida, como bem lembrou Carlos Fico há poucos dias, por uma possibilidade aberta pela própria Constituição de 1988.

A surpresa é que essa sanha autoritária tenha se personificado em um indivíduo que tem uma ameba no lugar do cérebro. Isso é assustador. Não se sabe exatamente o que será esse governo que terá início no dia 1o de janeiro de 2019. Não sou nada otimista. Nossas instituições são frágeis e grandes parcelas da população têm se mostrado muito violentas.

Logotipo do extinto Serviço Nacional de Informações (SNI). Foto: Governo da República Federativa do Brasil (Creative Commons)

Tenho observado muitas pessoas que saíram ou irão sair das redes sociais como forma de proteção. Compreendo esse posicionamento, no entanto não será o que irei adotar. Não acho que sair das redes traga algum tipo de proteção (a não ser psicológica, já que tanto lixo circula por aqui). Não esqueçamos que na ditadura militar, quando nem internet havia, os chamados “subversivos” e “comunistas” foram caçados sem nenhum pudor pelo complexo sistema repressivo do regime. O acervo do SNI está aí para provar esse fato. Há mais de 300 mil pessoas fichadas nos arquivos do famigerado órgão. Certamente, essa quantidade enorme de indivíduos não era composta apenas pelos considerados “subversivos” e/ou “comunistas”. Há muitas pessoas ali que sequer atuavam em movimentos políticos de oposição. A investigação mais refinado desses documentos ainda está para ser feita. Não há dúvidas de que esse esforço de pesquisa traria muito mais complexidade para o debate. No entanto, em um governo (poderes Executivo e Legislativo) que despreza o conhecimento histórico e ameaça acabar com a CAPES, principal instituição de financiamento de pesquisa no Brasil, a tendência é que o debate continue rasteiro e pobre.

Eu tenho horror a participar diretamente da política partidária. Jamais me filiaria a um partido político. Minha militância é pelo democratização do conhecimento histórico sério e bem fundamentado. Nosso papel, como historiadores, talvez nunca tenha sido tão necessário.

Continuarei meu trabalho de pesquisa sobre a ditadura militar e com História Pública até quando for possível. Não é hora de ter medo. Bolsonaro é desprezível, mas será o próximo presidente do Brasil.


Paulo César Gomes é editor do site História da Ditadura.


PS: Acesse a lista de livros que construímos coletivamente com nossos leitores (Lista coletiva de livros)


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