O protagonismo das “Mulheres com Bolsonaro”
Desde 2013, observamos um crescimento intrigante da carreira política de Jair Messias Bolsonaro. Durante as manifestações contra o governo Dilma, já existiam algumas movimentações em torno de sua figura e de grupos neoconservadores que vieram a se expandir cada vez mais, em 2016, partir da deposição da ex-presidenta. Dali em diante, até as eleições de 2018, percebemos a consolidação e o auge desses movimentos, especialmente aqueles em prol de Bolsonaro, o que exige que eles sejam observados criticamente para que possamos compreender os conflitos políticos que ocorrem no cenário atual.
Durante esse período, foi possível notar que os movimentos de apoio a Bolsonaro se apropriaram do espaço digital. Vimos, nesse contexto, uma proliferação avassaladora de diversas páginas, grupos e perfis em redes sociais – como Facebook, Instagram e Telegram –, direcionados à divulgação do chamado movimento bolsonarista. Por essa razão, proponho analisar, neste texto, algumas páginas no Facebook de mulheres apoiadoras de Bolsonaro.
A página Sou mulher sou Bolsonaro, por exemplo, acumula aproximadamente 20 mil seguidoras e é descrita pela frase: “Por um Brasil com menos vitimismo e mais ação!”. Outras páginas presentes na mesma plataforma são: Mulheres com Bolsonaro, BolsoGatas, entre outras que constituem as comunidades online do bolsonarismo. As mídias sociais digitais, especificamente o Facebook, se tornaram uma importante ferramenta de comunicação, auxiliando a articulação dessas organizações.
É nesse contexto que observamos nas mídias uma crescente união de mulheres em prol de pautas bolsonaristas, colaborando para que os espaços midiáticos da internet sejam utilizados em favor de seus aspectos ideológicos. Estes espaços foram essenciais tanto para a disseminação de narrativas políticas de extrema direita quanto para indicar como essas questões quebraram as barreiras do âmbito individual e atingiram a coletividade.
Por isso é preciso indagarmos: como podemos analisar as mobilizações femininas a favor do bolsonarismo? Parte desses grupos e páginas são responsáveis por potencializar o novo conservadorismo do Brasil. Este se constituiu, nos últimos anos, a partir de disputas ideológicas, sobretudo políticas e religiosas. Além disso, o feminismo, segundo tais comunidades, é visto como um movimento que enfraquece a família e destrói os chamados ideais tradicionais.
Refletir sobre as falas e os atos dessas organizações femininas é fundamental para compreendermos que a campanha de Bolsonaro conseguiu atingir uma quantidade expressiva de mulheres. Esse processo se tornou um trabalho mútuo, pois tais mulheres utilizaram as mídias para propagar a campanha de Jair Bolsonaro e suas ideologias extremistas. Nota-se, portanto, o surgimento de uma dinâmica de retroalimentação entre esses grupos e as páginas mencionadas, com destaque para as particularidades simbólicas da campanha bolsonarista.
O crescimento de grupos bolsonaristas pode ser percebido como tendo raízes em antigos regimes militares, fascistas e demais tradições autoritárias. Desse modo, representam uma “maré conservadora”, um símbolo do fortalecimento das chamadas “novas direitas” (Caldeira Neto, 2020). Estas se estabeleceram conforme as necessidades políticas, sociais e econômicas que vêm se desenvolvendo em suas complexas disputas desde, pelo menos, o golpe de 2016.
Nesse aspecto, a internet se tornou um ambiente muito propício para a germinação dinâmica e veloz de discursos e ideias bolsonaristas, constituindo e alavancando – no período que antecedeu as eleições de 2018 – uma imagem do então deputado Bolsonaro como um outsider.
O compartilhamento de fake news, memes e imagens de incentivos a atos antidemocráticos faz parte da linguagem das publicações das eleitoras bolsonaristas. Mas onde mais estariam essas mulheres? Qual sua faixa etária? De que classe social fazem parte? Por que se identificam com a imagem de Bolsonaro? Outro ponto significativo é perceber como as próprias redes sociais são influentes no cotidiano das eleitoras, uma vez que a propaganda política se concentrou na internet. Na que pesquisa que desenvolvo atualmente, busco refletir sobre tais questões.
É indispensável notar as subjetividades entre as falas e representações presentes nessas páginas. As pesquisas sobre o bolsonarismo ainda são muito recentes, portanto uma parcela relevante dessas mulheres, mesmo que influenciadas a participar dos movimentos, não se autointitulam necessariamente como bolsonaristas, mas se reconhecem em certos fragmentos do caleidoscópio de temáticas abordadas pelas campanhas sistematizadas por Bolsonaro.
Além disso, o envolvimento dessas mulheres se dá pelo reconhecimento da maneira como cada indivíduo concebe a ideia de sociedade. A proteção da família e dos “bons costumes”, os discursos sobre os valores cristãos, as delimitações dos espaços sociais femininos, entre outros. Todos esses aspectos, fragmentados ou não, contribuem para que se formem bolhas estratégicas na internet.
Entre a internet e a vida real, as Mulheres com Bolsonaro se difundiram não só pelo espectro da campanha de Bolsonaro, mas também no sentido de levantar a bandeira e as pautas antifeministas. Dito de outro modo, os debates giram em torno das questões do lar e da família, isto é, vinculam-se aos valores tradicionais conservadores. Embora sejam temas relacionados à vida privada, essas mulheres levam-nos para a esfera pública.
Em linhas gerais, é fundamental notar a ascensão dos movimentos autoritários dessa nova direita partindo de uma perspectiva que leve em conta os grupos femininos e seu significativo crescimento na internet. Durante esse processo, houve fases em que elas conseguiram não apenas um engajamento político expressivo, mas também uma notável relevância social e histórica para uma representação social feminina dentro dos moldes da extrema direita conservadora.
Referência:
CALDEIRA NETO, Odilon. Neofascismo, “Nova República” e a ascensão das direitas no Brasil. Conhecer: Debate entre o Público e o Privado, v. 10, n. 24, p. 120-140, 2020.
Como citar este artigo:
SILVA, Jamile Pinheiro Da. O protagonismo das “Mulheres com Bolsonaro”. História da Ditadura, 4 mar. 2024. Disponível em: https://www.historiadaditadura.com.br/post/o-protagonismo-das-mulheres-com-bolsonaro. Acesso em: [inserir data].
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